Legal & artificial

Temos visto por aí um verdadeiro boom de influencers virtuais representando altas marcas ao redor do mundo. Não estamos falando de blogueiros e dançarinos do TikTok, mas de pessoas 100% feitas em computador, através de modeladores de CGI.

Temos exemplos recentes: a Sam, da Samsung, e a Rennata, da Renner, que foram lançadas para criar conexão com os consumidores na hora de escolher produtos — e dar aquela forcinha no branding. Antes delas existiam a Lu, do Magalu; a Nat, da Natura; o Baianinho, das Casas Bahia; a Mara, da Amaro; Dai, da Dailus etc. Na gringa, rolam até as influencers “independentes” — pois não representam uma empresa só —, como a Miquela Sousa (Lil Miquela), o Blawko e a Shudu Gram, considerada a primeira supermodelo digital do mundo. Lá nos States, o KFC também exibiu por um tempo a versão hipster do Coronel Sanders. Assim como nós, seres humanos, os influencers digitais têm personalidade, causas e até um lifestyle a sustentar. E o que esperar disso? Role a página…


Elah faz o mundo delah

Nesta era do cancelamento, há um temor das marcas em relação a maus comportamentos dos influencers humanos. Ligando os pontos, já dá para sacar que, embora sejam gerenciados por pessoas reais-oficiais, os avatares influencers têm potencial de gerar menos prejuízo nesse sentido. E outra: segundo este report do HypeAuditor sobre influencers virtuais no Instagram — sim, isso já existe —, um perfil dessa categoria pode gerar até 3 vezes mais engajamento em relação a uma pessoa real. Trazemos provas: a Lu do Magazine Luiza é 10ª influenciadora mais seguida do Brasil. Em apenas três meses, ela bateu a marca de 1 milhão de seguidores no TikTok — hoje ela acumula quase 3 milhões e tem a conta com maior crescimento no mundo. No Instagram, são nada menos que 5,3 milhões de seguidores altamente engajados; no YouTube 2,5 milhões de inscritos, o que rendeu à Magalu o título de primeira varejista do mundo a ultrapassar a média de 1 milhão de inscritos na plataforma de vídeos. A empresa atribui à influencer digital seu sucesso atual, em termos de expansão física e digital e ampliação da clientela.


Quase replicantes

Aliás, essa famosidade toda da Lu foi parar lá na gringa, especificamente em uma matéria do Observer na qual ela é descrita como: “a maior influencer não humana do planeta”. Em um patamar mais “modesto”, em Los Angeles a americana com descendência brasileira Miquela Sousa tem 3 milhões de seguidores no Instagram e já figurou em publis da Calvin Klein e Prada. Já a sul-africana Shudu Gram, com 218 mil seguidores, apareceu em capas de revistas, como Elle, Vogue, Cosmopolitan e recentemente em uma edição de aniversário da Glamour Brasil. Para chegar a esse nível de proximidade com o público, os virtual influencers postam fotos e vídeos que imitam situações cotidianas de pessoas reais. Isso pode ser notado na iluminação ambiente, textura de suas roupas, cenários, participação de entrevistas e até parcerias com famosos ou outros influencers digitais.


Humanize-se

Tais estratégias visuais se aliam a uma comunicação verbal e corporal moderninha, com tons de storytelling, e pegada nas tendências comportamentais do momento — memes, ativismos e desafios nas redes sociais. Esse combo é estratégico, e tem como objetivo dar um ar humanizado aos influencers digitais e, consequentemente, às marcas, o que é bem irônico, convenhamos. E por trás da construção desse caráter, há um exército de profissas: designers 3D, programadores, profissionais de marketing, redatores, fotógrafos etc. Diante de seu envolvimento em tantos setores/mercados, analistas e empresas experts em branding acreditam que essa tendência deve só crescer. Logo, deve impulsionar ou se misturar com novas carreiras, negócios e movimentos culturais — por exemplo, roupas digitaisNFTs, bots de comunicação, agências especializadas nesse tipo de influencer e por aí vai. Aliás, essa novidade não deve roubar o emprego de profissionais da TV, cinema, moda e web, mas abrir caminho para novos mercados.


Ligados no avatar

Isso é o que a pesquisadora belga Dovile Dudenaite defende em sua dissertação de mestrado, dedicada a analisar a influência de Lil Miquela, Shudu e da boneca virtual Noonoouri no Instagram. Nesse trabalho, ela ainda constata que a reprodução do aspecto humanizado, em especial no modo de agir, dessas criações artificiais acabam sendo atrativos para o público. Também argumenta que o poder de engajar e instigar discussões no meio do povão através de suas contas na rede são indícios de que nessa altura os virtual influencers sejam formadores de opinião. Já neste artigo, a pesquisadora do MIT Kelly Wagman, expert em computação e ética social, diz que esse tipo de relação virtual com humanos pode não trazer perigos para a saúde. Porém, isso funciona quando os influencers digitais deixam claro seu status de um ser artificial — afinal, eles podem ser extremamente realistas visualmente. 


Don’t stop me now…

Depois de bater um papo com psicólogos, ler trabalhos acadêmicos de várias áreas e ver vídeos especializados, constatamos que ainda existem algumas questões abertas: interessamos-nos pela imagem e reações de perfeição desses avatares — em um mundo de harmonização facial a rodo? Ou nos sentimos atraídos justamente pelo fato de sabermos que não se trata de objetos humanos? O quanto é possível criar uma conexão verdadeira com um robô, à lá Her? É possível se sentir acolhido por essas criações? Como fica a diversidade, já que na maioria dos casos eles são criados por pessoas privilegiadas? Quais questões éticas as ações dessas figuras podem gerar? Vamos refletir juntos, briefers…


Fonte: https://www.tecmundo.com.br/the-brief